Cabras, o que são?
A cabra, animal de quatro patas que dá pelo nome científico de capra aegagrus hircus, “é um animal herbívoro pertencente ao género Capra. A cabra doméstica é considerada uma subespécie da cabra selvagem que habita o sudoeste da Ásia e Europa Oriental”, blá, blá, blá Wikipédia dixit, logo, qualquer um o poderia dizer e de forma bem mais original. Assim, e porque nada disso tem verdadeira importância para efeitos explicativos e esclarecedores deste texto, aqui fica o que importa reter. Cabras são animais encantadores. Ninguém como elas sabe viver a vida com encanto, empenho e alegria. A elas se deve o delirante verbo cabriolar.
São o animal mais easy going do planeta. Está tudo bem para as cabras, desde que tenham companhia e se sintam livres. Livres para saltar, correr, dar marradas e pinotes, correr mais um pouco, saltar ainda mais vezes e, se possível, mais alto. Caso os borregos não fossem tão adoráveis, as cabras ocupariam, isoladas e sem concorrência por perto, o podium de animal que mais satisfação causa ao ser observado. O que quer que façam… é divertido. Têm um cheiro peculiar, muito próximo do da terra, o seu pelo é do tipo áspero e os seus cornos verdadeiramente rijos. Têm olhos vivos e brilhantes. E estão constantemente a rir. O que até pode ter a ver, mas não se deverá em exclusivo, com o facto de serem ruminantes, uma vez que as vacas também ruminam, mas não têm a linha dos lábios tão para cima, com os cantos praticamente revirados, como as divertidas e curiosas cabras. Como disse, as cabras são genuinamente encantadoras. Do melhor que entrou, naquele dia, na Arca do Noé. Isto é, praticamente, mais ou menos tudo o que interessa saber sobre as cabras: são giras e divertidas. O que torna ainda mais estranhas todas as outras conotações que circulam desde sempre e se travestem com o nome de cabra.
O que delas se diz? Que cabras tão catitas!
Cabras ocasionais
Há quem defenda que todos temos bom e mau coração e que todos agimos bem e mal em determinados momentos. Que não há pessoas exclusivamente boas e outras somente más, e que a maldade acontece de vez em quando a toda a gente, tal como os gestos de bondade e abnegação. Outros defendem uma clara dicotomia entre boas e más pessoas. Ou se é de um tipo ou se pertence a outro. Assim, sem mais. Seja qual for o pendor do leitor para qualquer uma destas categorias, seja a título contínuo, ou num momento disruptivo, a verdade é que, quando em situações limite, em que se impõe uma escolha moral que envolve terceiros, certos indivíduos tendem invariavelmente para a maldade. Naqueles nanossegundos em que poderiam fazer realmente a diferença, as cabras ocasionais, que nem sempre são catalogadas enquanto tal, tendem para a resposta errada. Prejudicam, batem, maltratam, vão atrás do elogio fácil e caem na poça lamacenta do lado obscuro da humanidade.
Assim, a cabra simples, aquela que apenas é cabra aos olhos dos outros, é a amante, os liberais e levianos, o chefe, o vizinho rico ou a amiga giraça, enquanto a cabra ocasional é aquela que conseguimos reconhecer em nós próprios em dado momento. Quando invejamos a vida fácil de alguém que conhecemos, ao invés de dela nos congratularmos; quando cobiçamos coisas de outrem sem saber dar valor às coisas que são nossas; quando desejamos o namorado/a giro/a de alguém que pensamos que apenas o/a conquistou porque apareceu primeiro na sua vida; quando mentimos sem razão sólida aparente;… São a versão pobre, desatualizada e mesquinha das cabras que gostaríamos de ser, mas nem sempre conseguimos. A cabra ocasional é aquela que critica a amante – que é solteira, descomprometida e nada deve a quem quer que seja –, em vez de condenar a conspurcada moral do cretino que tem mulher em casa, com quem se casou pela igreja e a quem prometeu aquilo que não conseguia cumprir: honestidade, fidelidade e respeito até que a vida os separasse. Este, sim, é a cabra de verdade.
O que delas se diz? Pobre cabra!
Cabras como nós gostaríamos de ser
Há, depois, outro género completamente distinto de cabras. Pode dizer-se que estas, As Cabras Como Nós Gostaríamos de Ser, que agora aqui descreveremos, são a melhor versão a que podem aspirar as pessoas normais aos olhos das anteriores cabras. São interessantes. Sedutoras e sexy. Têm uma vida social invejável e amigos em barda. Sabem dançar, têm estilo e são encantadoras e divertidas. As verdadeiras rainhas da festa. São gente desempoeirada, que olha a sua vida de frente e avança com ela. Com os seus erros e frustrações. Com as suas alegrias e vitórias. Como toda a gente. Pessoas centradas na sua felicidade e naquela que consigam proporcionar àqueles que as rodeiam. São os ditos indivíduos normais mas não banais. Por não darem ouvidos a terceiros e conseguirem ter caráter e uma personalidade bem resolvida, pouco ou nada ligam a comentários e falsidades. São gente com um bom radar, ou, pelo menos, com discernimento suficiente para esperarem conhecer alguém antes de tecerem falsos julgamentos, antes de avançarem para retratos robot pouco específicos e esclarecedores dos outros tipos de pessoas. Mesmo sobre aquelas que são, à partida, bem diferentes do seu próprio género. Por isso, quando se olha uma destas pessoas, que se erguem, livres e inspiradores, acima das massas amorfas, seguindo única e exclusivamente o alinhamento das suas próprias vidas, todos os outros, pertencentes a categorias menores da família caprina, acabam por semicerrar os olhos e apostar a vida que fulano ou beltrano, principalmente beltrano, é uma grandessíssima cabra. É fácil desejar e orientar toda uma vida no sentido de vir a ser uma destas cabras. Sinta-se livre para se juntar ao clube. Porque este tipo de cabras, tal como as primeiras, as verdadeiras, são gente feliz que sabe como ninguém o sabor de um bom salto, de uma marrada perfeita, de uma corrida errática, de um bom pedaço de erva verde e tenra. Apenas os invejosos e mesquinhos não as aguentam, principalmente, agora sim, se são mulheres, livres, soltas, desassombradas e de ideias liberais. Pior ainda se tiverem o atrevimento de serem inéditas, progressistas ou uma verdadeira carta fora do baralho. Cabem nesta categoria tantas diferenças que nem vale a pena enumerá-las, mas dir-se-ia que uma mulher homossexual, de cor, instruída e bem-sucedida, ocuparia o lugar primeiro de muito deste ódio primário.
O que delas se diz? Que gira que é, a cabra!
Seguinte.
Cabras de verdade
As outras cabras, as Cabras de Verdade – aqui, por cabras entendam-se pessoas, de todos os géneros, cores e feitios, e não apenas humanos do sexo feminino, ok? Esta definição de cabra é global e abrangente, já que há destas cabras em todo o lado –, as outras cabras, como ia dizendo, são gente má. Mesquinha e invejosa. Pessoas que, de tão pouca importância que dão a si mesmas, medem tudo o resto à sua escala e medida. Estas cabras são pessoas ruins, que conseguem descortinar maldade em cada interstício da vida, em cada esquina humana. São particularmente desocupadas e criativas. Inventivas, na verdade, e com enorme pendor para a vidência. Conseguem, só de olhar para outra pessoa que nunca viram na vida, adivinhar que são isto e mais aquilo. Estas cabras são as mães de falsas teorias e pseudoverdades, as quais vendem, por tuta e meia, como sendo a mais pura verdade, chegando a usar de argumentação pesada, alguns delírios e outras destilações tóxicas, resultantes de psicoses várias e complexos de inferioridade. Longe de lengalengas psicológicas, as cabras são azedas. Puro veneno. Como ocupam espaços de vida reduzidos, vazios e inócuos, preenchem os seus dias com considerações sobre os outros, chegando a não ser o principal sujeito das suas tristes vidinhas. Conspiram para piorar a vida das outras cabras do rebanho, sem encetarem o menor esforço em melhorar diretamente as suas vidas e personalidades, programam roubar o noivo da amiga apenas para que a outra não seja mais feliz do que ela própria, traem os colegas de trabalho apenas porque sim… Em alguns casos, estudos há que o atestam, estas cabras ocupam-se em exclusivo a destruir tudo à sua volta, alimentando, por vezes durante décadas, azedume e ódio a uma única pessoa ou grupo de indivíduos em particular. A estas cabras, o básico desinteresse dos seus alvos em relação a elas, alimenta ainda mais as suas fantasias e aguça mais os seus delirantes ódios. Esta, grosso modo, é a calamitosa descrição da cabra clássica, também ela ruminante, na medida exata em que nem cospe, nem engole a sua triste malvadez. É um ser ressabiado e lamentável. Bom mesmo, é ter o discernimento para saber distinguir umas de outras, porque, e para concluir, cabras somos quase todos, apenas há que perceber a que género de cabras nos adaptamos melhor.
O que delas se diz? Que grande… vaca!
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