Ainda está por inventar um prato mais democrático do que o bom do rissol. De peixe, de camarão, de carne, de legumes, com coisas frescas, com sobras de ontem ou de amanhã, com ingredientes quase em fim de linha, mas que no meio do barulho da frigideira ainda apuram inesperados sabores, quaisquer rissóis se entregam de alma e coração, como nenhum outro prato, tanto a coisas muito boas, como a coisas menos boas… É o upcycling aplicado, e bem, à cozinha.
Acompanham bem com arroz ou sozinhos, com branco ou tinto, com ou sem pão, quentes ou frios, bem ou mal-amanhados, mais ou menos arredondados, com ou sem rendilhado na ponta… São a coisa mais adorável que se possa imaginar. Estão lá para o que der e vier. Sempre prontos, adaptáveis – e sabemos bem como adaptabilidade é a mais elegível das soft skills perante tudo o que por aí vem –, solícitos, pró-ativos, disponíveis, amigos do seu amigo, humildes, resolutos e determinados, agradecidos com o que quer que se lhes coloque dentro, tudo abraçam com dedicação, com tudo se deitam e deleitam fazendo colherzinha.
Comovemo-nos sempre que falamos de rissóis. Comida honesta. Do povo para o povo. Claro que salpicam tudo, que sujam a cozinha de cima a baixo, que nos queimam os braços e a paciência, que sempre que nos pomos com isso juramos que é a última vez… Por isso, o melhor é comprá-los feitos. Esses ficam sempre bem, louros, bem panados, inchados e vistosos. A cozinha mantém-se limpa, a frigideira a brilhar e os seus braços delicados e hidratados. Isso é de valor incalculável, além do que poupa os pés e as pernas, pois sempre demoram a confecionar, os malandros. Claro que se tem pavor de desperdícios, e tem sobras ou coisas menos boas que queira despachar, não hesite e prepare já uma boa leva de rissóis. Se os convidados torcerem o nariz, simplesmente não merecem o seu respeito. A prova dos rissóis é a mais pura prova dos nove em relação ao caráter de qualquer pessoa.
Ingredientes:
– Coisas boas ou menos boas
– Massa de rissol (está no singular, mas deve dar para o plural)
– Um copo para recortar a massa ou uma daquelas coisas muito úteis que fazem aquele recorte divertido nos rissóis com bom ar
– Azeite ou óleo bem quente
– Escafandro para se proteger dos salpicos do azeite ou óleo ferventes
– Um dia muito bom, para equilibrar a trabalheira
Tempo de preparação:
Uma semana para se mentalizar. Dois dias para preparar tudo. Mais um dia para ganhar balanço. Depois de tudo isto, é rápido, mas depende muito da quantidade da fritura e da potência do fogão e se realmente os confecionou ou se andou vir do café da esquina, ou daquele outro mais central.
O rissol, democrático e popular. Alvo de difamação quando o colocamos no forno, onde resiste e se mostra pálido, com sabor mas nem metade do aroma do tradicional frito. O dia muito bom que o rissol, frito e tradicional, provoca, é gerado por ele próprio, ao dar o pontapé de saída!
Blog bem saboroso, este! Parabéns!
Tão verdade, Ricardo! Ainda bem que gosta de boa mesa. E muito obrigada!